O presente trabalho tem como objectivo a elaborao de um texto pessoal sobre um ou mais aspectos do texto apresentado.
Introdução:
O presente trabalho tem como objectivo a elaboração de um texto pessoal sobre um ou mais aspectos do texto apresentado. Apesar do tema principal deste trabalho ser as religiões (e as Igrejas) em crise, de forma explícita e implicitamente, inevitavelmente abordarei os vários parágrafos do texto, dada a sua inter-relação óbvia e determinante para uma melhor compreensão e percepção destas mudanças de religião, nas suas práticas e novas perspectivas. É, pois, evidente o aparecimento de cada vez mais novas práticas religiosas e o facto das instituições religiosas tradicionais e as suas práticas estarem cada vez mais desacreditadas e ultrapassadas.
Toda esta problemática actual se traduz numa crise das instituições, quanto ao seu fundo teológico e ao papel social por si desempenhado claramente alterados. Esta nova era de novas tendências religiosas não é mais do que um reflexo das mudanças sociais e culturais das sociedades modernas e globalizantes.
Num mundo marcado por profundas transformações socio-políticas, económicas, culturais, o universo social é profundamente abalado. O desenvolvimento de instituições sociais modernas e a sua difusão pelo mundo criaram grandes oportunidades, mas também uma grande insegurança. Milhões de pessoas são afectadas pela descontextualização dos sistemas sociais e cada vez mais se afastam das doutrinas teológicas tradicionais e práticas dogmáticas das religiões tradicionais.
Ao longo dos tempos, a religião sempre serviu de refúgio para os homens. Os rituais religiosos primitivos constituíram-se em algumas das primeiras formas de comunicação social, o que foi preservado e acentuado por todas as religiões e igrejas modernas. Porém, apesar da sua aparência magnânima, muitas vezes a religião foi utilizada como pretexto para a tomada de territórios e mentalidades. Hoje, a religiosidade permanece indissociável ao ser humano e a sede de poder continua associada aos líderes mundiais. As disputas e as guerras religiosas mudaram de fisionomia e o campo de batalha e as armas foram substituídos pelos discursos preparados e propagados através dos meios de comunicação social. Mas, todo este conjunto de identidades e lealdades religiosas está a mudar.
É, portanto, imperativo, reflectir sobre a realidade complexa, com vista à construção global contemporânea, de onde as transformações religiosas são um reflexo primordial para esta percepção de mutação cultural e social. A compressão do tempo e do espaço e as diversas mobilidades fazem surgir uma cultura global. Esboça-se uma sociedade diversificada e em mudança vertiginosa, defensora de alternativas, quer a nível político, institucional, económico como religioso. Tendo como exemplo mais o catolicismo português, ao longo deste trabalho, vou debruça-me essencialmente sobre a religião católica e a sua crise interna, abordando, por outro lado, as várias tendências religiosas e institucionais, de um ponto de vista teológico e social.
O individualismo numa era de mudanças culturais e sociais
O ser humano está inserido numa sociedade que apresenta um constante processo evolutivo em todos os domínios- económicos, políticos, demográficos, tecnológicos, geográficos, socioculturais- que se traduzem inevitavelmente na evolução religiosa e transformações nas práticas religiosas de actualmente. Neste sentido, poder-se-á considerar que a religião é mais um produto da sociedade do que a sociedade é fruto da religião vigente. Pode até afirmar-se que cada sociedade ou comunidade institucional adopta aquela religião que mais lhe convém, em que se uma muda a outra forçosamente acompanha esta mudança - "A sua teologia foi um produto das culturas para responder às respectivas necessidades (étnicas, nacionais, históricas").
Na actualidade, quando uma sociedade se depara com qualquer tipo de mudança, ou seja, qualquer alteração estrutural ou funcional que se verifica numa organização social ou na organização mental dos indivíduos, encontra, por conseguinte, mudanças que implicam alterações nas estruturas, nos comportamentos, nos valores, nas atitudes e, consequentemente, na cultura existe nesse dada organização social. Esta mudança faz-se de forma constante e global, que se traduz num fenómeno internacional de globalização económica, política e cultural. Este processo de socialização realiza-se sempre enquadrado num determinado contexto socio-estrutural, cuja a análise micro-sociológica do processo de interiorização deve ter sempre em atenção uma compreensão macro-sociológica dos vários aspectos da estrutura social em que se desenvolve, é fundamental, uma compreensão do social onde ela surge.
A identidade surge, neste contexto, de uma relação entre a sociedade e o indivíduo sendo construído por processos sociais, face a uma determinada realidade subjectiva, que são condicionados pelo contexto socio-estrutural onde se desenvolve. No entanto, as identidades formadas pela interacção da consciência individual e da estrutura social podem, contudo, manter ou remodelar ou alterar a estrutura social apresentada. Determinadas estruturas sociais produzem tipos de identidades que podem ser identificados em casos individuais. Isto traduz-se em diferentes tipificações de identidades que variam de indivíduo para indivíduo, face ao contexto socio-estrutural onde se enquadra. Estes tipos de identidades são, pois, produtos sociais, ou seja, trata-se de uma identidade enquanto fenómeno social.
Nas sociedades contemporâneas, deparamo-nos com características de um individualismo gradual. Isto é, a modernidade actual dita ao indivíduo um destino que é o de confrontar-se consigo próprio. Durante muito tempo a referência ao colectivo foi um meio fundamental da satisfação das necessidades individuais. Cada indivíduo tinha a impressão de que as normas sociais e as instituições o serviam e ajudavam a encontrar o seu lugar. Hoje em dia, há cada vez menos possibilidade de contar com uma acção colectiva para a resolução das dificuldades de cada um, ou para a defesa das suas reivindicações. A pertença a um grupo deixa de estar presente para dar sentido ao indivíduo, o que se traduz numa pressão mais forte sobre cada um de nós. Vivemos numa sociedade global onde o indivíduo terá de ser cada vez melhor e com um constante auto-estima, quer no aspecto pessoal como no profissional.
Actualmente, participar enquanto indivíduo na vida social significa o cada vez menos ser conformista com normas e papéis pré-determiandos. Os valores sociais da cultura dominante são os da flexibilidade, do risco, da complexibilidade, da incerteza, da disponibilidade para a comunicação permanente e de uma capacidade constante de se adaptar a diferentes postos de trabalho. Neste contexto, o indivíduo vai entrar em conflito com a sua própria identidade, dado que esta se deve caracterizar como estável, em que os comportamentos ao serem orientados por valores não se modificariam a todo o momento. Perante toda esta conjuntura de mutações culturais, entre outras, os indivíduos cada vez mais vão questionar a religião e as suas práticas e princípios doutrinários, o que pressupõe uma gradual crise nas instituições e dogmas teológicos.
A religião ao longo dos tempos, na sociedade contemporânea e tendências actuais do fenómeno religioso.
Ao longo dos tempos, a religião de forma directa ou indirecta sempre manteve uma relação próxima, de interdependência e de coexistência com o contexto sociocultural. Os fenómenos Religião e cultura sempre estiveram e ainda continuam a estar interligadas. Obviamente a relação entre ambas varia de cultura para cultura: por exemplo na América Latina a religião apresenta-se como uma fonte de inovação ao passo que nos países árabes, onde vigora o Islamismo, a religião assenta num factor de conservação da tradição; em países ocidentais, como é o caso português, assiste-se cada vez mais a um afastamento da instituição eclesiástica maioritariamente existe que é o catolicismo (é aqui importante reforçar que este trabalho tem vindo a ser e vai basear-se essencialmente na religião católica, tendo como exemplo próximo o caso de Portugal).
Na passagem da Idade média para o Renascimento começa a acentuar-se a crítica à religião. Mais perto de nós, as grandes transformações socioculturais do mundo ocidental podem traduzir-se em factores como o processo de racionalização e cientificação dos conhecimentos, que se traduz num desencantamento do indivíduo, do mundo, da história (a morte de Deus). Em oposição surge a recuperação de factores extra-racionais e uma forte crítica à racionalidade e à ciência, aumentando por outro lado, movimento carismáticos e espontâneos religiosos, quer dentro, quer fora da igreja. Outro facto a evidenciar é a autonomização do temporal até à contraposição ou mesmo negação do sobrenatural. Com ela se relaciona o aparecimento do "espírito laico" e a especificação institucional da sociedade a respeito da religião, e do Estado a respeito da igreja. Ainda a salientar as contradições históricas do religioso. As guerras religiosas, Inquisição, Giordano Bruno (filosofia), Galileu (ciência). Surge também a necessidade de situar no tempo a instrumentalização da religião nos processos de conquista socio-política ou de colonização (cultural) com o pretexto de difusão da fé. Existem ainda outros fenómenos mais recentes que tiveram influência para caracterizar este novo período moderno, a saber: a industrialização e a urbanização; tendência a desautorizar as instituições tradicionais; movimento pendular entre ideologia liberal e colectivista; pluralismo teológico e ideológico; tiveram influência sobre a transformação sociocultural e sobre o modo de explicar o mundo e a religião.
As tendências actuais do fenómeno religioso, podem reduzir-se, segundo alguns autores, em três grandes domínios: diminuição ou progressiva marginalidade; persistência no tempo; nova criatividade e relativa resposta às novas exigências religiosas:
- Tendência para a diminuição: Dedica-se menos tempo às actividades e manifestações religiosas. A dimensão religiosa não consegue ser elemento de integração da existência. A religião perde o monopólio de dar "significado" e "legitimação" à existência. Verifica-se assim uma maior concorrência das várias ideologias, acentuando-se também a liberdade e responsabilização do indivíduo em detrimento da moral institucionalizada;
- Tendência para a persistência: é uma manifestação do uso da liberdade, em que não há sanções da parte do Estado. Purificam-se as motivações, mas apesar de tudo na prática ainda se assiste em larga medida: Baptismo, Primeira Comunhão, Casamento religioso, frequência da missa, peregrinações, festas, etc. Neste sentido, pode continuar a persistir grupos que matem princípios, normas, valores, cuja origem é religiosa, como são exemplos a pecabilidade, perfectibilidade, amor ao próximo, perdão, rejeição da violência, etc;
- Aparecimento de novas perspectivas: Aparecimento de novos movimento religiosos, novos líderes carismáticos, que criticam as religiões tradicionais, o que ...
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- Tendência para a persistência: é uma manifestação do uso da liberdade, em que não há sanções da parte do Estado. Purificam-se as motivações, mas apesar de tudo na prática ainda se assiste em larga medida: Baptismo, Primeira Comunhão, Casamento religioso, frequência da missa, peregrinações, festas, etc. Neste sentido, pode continuar a persistir grupos que matem princípios, normas, valores, cuja origem é religiosa, como são exemplos a pecabilidade, perfectibilidade, amor ao próximo, perdão, rejeição da violência, etc;
- Aparecimento de novas perspectivas: Aparecimento de novos movimento religiosos, novos líderes carismáticos, que criticam as religiões tradicionais, o que traduzir-se-á em novos movimento bem como no ressurgir da religiosidade popular, na emergência de novas espiritualidades e novas relações com Deus e o sagrado.
As novas criações, que definem as mutações religiosas, não podem verificar-se se não se respeitarem os constrangimentos e consignações da experiência do sagrado. É importante aqui referir-se que este processo de emergência de novas religiões, espiritualidades, seitas, etc., que manifestam mutações religiosas, não se realizam aleatoriamente, visto que obedecem a regras, regras de transformação, e que se produzem no interior de um indivíduo ou de uma comunidade para com o sagrado. O afastamento da seita em relação à Igreja não é, portanto, senão a tradução de um outro afastamento nas leis da natureza ou nas leis da sociedade. O que faz com que, paradoxalmente, a emergência que quer esconder a mutação sob a continuidade acabe numa verdadeira revolução das mentalidades e das sensibilidades- enquanto que os pressupostos dogmáticos que insistem na descontinuidade não assegura senão reencontrar, finalmente, uma continuidade perdida (a harmonia do cosmos ou a harmonia da sociedade). Muitas das chamadas "seitas" tentam no fundo a separa o religioso do social, com vista a uma relação mais completa, interior e subjectiva para com Deus.
A Religião na Mudança numa Era em constante Mutação Cultural e social
- As religiões (ou as Igrejas) estão em crise-
A religião, de cada comunidade, apresenta-se como um reflexo da sociedade onde se insere, ou seja, um produto construído pelos constituintes e instituições de um dado corpo social. Neste sentido, se a sociedade se modifica, a religião, inevitavelmente irá acompanhar essa mudança, verificando-se assim uma modificação das religiões tradicionais, quanto à sua base teológica e ao seu papel social.
"Surgem alternativas filosóficas litúrgicas (formas e técnicas de culto) que tanto superam as deficiências das igrejas tradicionais como dão resposta às novas necessidades"
Na actualidade, verifica-se cada vez mais uma busca pessoal do indivíduo, ou seja, uma tentativa de encontro com o seu "eu" individualizado e diferente dos outros o que contrasta com a ideia de comunitarismo e pensamentos e atitudes comuns do passado, sendo, a meu ver, um dos exemplos mais flagrantes, a religião- cada vez menos se assiste a comunidades religiosas coesas e com "fés" iguais e mais a uma procura individual da fé (este é apenas um entre outros exemplos que salientarei).
Neste contexto, se cada vez mais se constata a importância e valor do indivíduo, a religião vai reflectir essa mudança no seu interior, dado que todas as mudanças religiosas que se verificam são reflexos das mudanças culturais de uma determinada sociedade ou civilização. Por outro lado, também no interior da família, a ideia de indivíduo mudou e se impõe bem como na sexualidade, preferências ou orientações, o que há séculos atrás era impensável e digno de exclusão da instituição religiosa.
A Igreja Católica apresenta uma doutrina e dogmas que cada vez mais estão ultrapassados e justificam muitos destes dogmas através da palavra de Deus, ou melhor, Jesus Cristo. Por exemplo, quanto à família e ao casamento não se registam nos textos sagrados alusões claras quanto a estas "banalidades civis", como afirma Moisés Espírito Santo, em A Religião na Mudança- a nova era, uma vez que Jesus pregou uma ideologia que não privilegiava qualquer tipo de particularismos culturais. E este exemplo estende-se a muitos outros, como é por exemplo a questão da sexualidade.
Actualmente, ou para se ser mais precisa, com a pós-modernidade, assiste-se a uma era de mudanças comportamentais explicitamente relacionadas com mudanças familiares, profissionais, vivenciais, sexuais e religiosas. Quanto a este último ponto é interessante verificar-se que embora toda esta doutrina e dogmas religiosos (e no caso português, a ideologia católica) esteja a perder adeptos, a realidade é que cada vez mais surge a necessidade do indivíduo se encontrar, a um nível mais espiritual do que fisicamente ao se identificar com esta ou aquela religião específica. Com efeito, é também cada vez mais visível o aparecimento de "seitas" , em que muitas vezes assiste-se a um retorno aos valores religiosos, mas verifica-se também gradualmente um afastamento das práticas religiosas tradicionais.
"A religião continua a "religare" mas outras realidades"
É, pois, evidente, a existência de uma mudança global dos valores morais, intelectuais e até científicos, em que estas mudanças culturais e mentais das sociedades evidenciam-se, largamente, através das mudanças religiosas, face, por exemplo, ao inúmero conjunto de inovações espirituais que emergem. Tudo isto, e segundo Moisés Espírito Santo, devido à "restauração do valor individual (...) constituído de matéria-e-espírito, holístico".
Numa época de globalização entramos, portanto, numa época em que o indivíduo passa a ocupar um lugar preponderante, assistindo-se, nesta "nova" sociedade a uma desvalorização das doutrinas e dos dogmatismos das instituições religiosas, o que também se deve a uma maior racionalidade( e avanços científicos), face a mudanças mentais, intelectuais e de comportamentos sociais.
É importante salientar que não estamos perante um individualismo, que vulgarmente se associa a algo negativo e egoísta. Pode aqui falar-se, e de novo aludindo ao sociólogo Moisés Espírito Santo, de um " individualismo sociológico". Entende-se aqui esta atitude mais individualizada como um processo através do qual o indivíduo se torna mais autónomo e com maior liberdade, de modo também a encontrar a sua própria identidade e esta ser reconhecida por parte dos outros. Ao mesmo tempo, esta individualização geral está também a contribuir para uma mudança social. De acordo com Moisés Espírito Santo, tendo em conta os domínios culturais, sociais, mentais e cívicos de individualização "o individualismo sociológico é a tomada de consciência do ser humano como ente singular, regulado autonomamente, propensamente livre, tendencialmente diferente, parceiro de direitos e deveres".
Apesar de hoje em dia se verificar uma maior liberdade individual e direito à diferença, nas sociedades tradicionais de antigamente privilegiava-se o "todo", isto é, uma identidade colectiva, que se justificava pela introdução dos indivíduos numa determinada família, casta, instituição, aldeia ou religião, ao passo que a diferença individual era quase inexistente. Neste sentido, a referência de um indivíduo à sociedade era colectiva. Por exemplo, o facto de alguém nascer num determinado país ou numa determinada religião era atribuída a essa pessoa uma identidade associada a um colectivo, ou seja, a um "todo".
O individualismo, já havia existido, mas vai surgir novamente em grande força no século XV com o desenvolvimento das cidades e a emergência da actividade mercantil burguesa, paralelamente com o aparecimento do Iluminismo. Contudo, a afirmação e institucionalização do individualismo (que tem vindo a constituir gradualmente uma "sociedade de indivíduos"), dá-se sobretudo com a tese de Lutero ("Justificação pela fé"), em 1517.
É, nesta perspectiva, que se poderá falar num individualismo religioso, que somente há algumas décadas se destacou. Talvez porque, se calhar, até então a sociedade não tenha permitido esse desenvolvimento e só com uma mudança social e cultural é que foi possível a emergência de novos modos de fé e "religiosidade". Porém, não é, e não era, a religião, ao contrário do que se possa pensar, que constrói as culturas, são estas sim que constroem e adaptam as ideologias religiosas de acordo com a sua cultura e personalidade de base, que passa a fundamentar-se numa linguagem sagrada que justifica as suas acções. - "A sua teologia foi um produto das culturas para responder às respectivas necessidades". Neste sentido, e do meu ponto de vista, em qualquer momento da história, a religião sempre esteve associada à cultura dominante, em que ambas são simultaneamente causa e efeito, estando, por conseguinte, em constante interacção. Estes dois conceitos sempre estiveram interligados, de modo que para uma mudança cultural se verificar era preciso o consentimento da Religião. Com efeito, primeiro surgem as mudanças religiosas (na maioria das vezes sob a forma de heresias ou cismas) e só depois se dava a institucionalização de uma dada mudança cultural. É interessante referir-se que na história do Cristianismo, todo o conjunto de cismas, heresias ou contrariedades e oposições face ao poder católico foram sempre devido a incompatibilidades ou antagonismos culturais.
No século XVI surge um novo movimento religioso, motivado pelo desenvolvimento do capital económico (a que o catolicismo se opunha) o que vai contrariar a ideologia e referências religiosas que se praticava por uma instituição religiosa absolutista e autoritária. Surge aqui o Cristianismo Protestante, face às mudanças económicas e sociais da época. Este é apenas um início das muitas reacções às práticas e às ideologias dogmáticas defendidas pelo Cristianismo católico. Por outro lado, o individualismo religioso emergiu paralelamente com a adesão à tese teológica de Martinho Lutero, que argumentava que a salvação era alcançada através da fé. Para a teologia "justificação" significa ser justo, honesto, solidário; para a Igreja Católica "justificação" significa uma prática (sacramentos, orações, obediência à igreja, etc.) de acordo com as normas da instituição, ao passo que Lutero defendia que um indivíduo se salva pela fé em Cristo e não pelas obras. Os protestantes, por seu lado, defendem que estas obras são um efeito da fé.
Neste contexto pode, portanto, falar-se em individualismo religioso- que actualmente cada vez mais se afirma como um modo de um espiritualidade moderna, isto é, uma alternativa filosófica litúrgica- pois parte-se do pressuposto que a fé é individual e subjectiva, isto é, pertence a cada um e só cada um sabe se a tem ou não.
As mudanças culturais e sociais, com o passar dos tempos, passaram a pôr-se em causa certas práticas e dogmas. Por exemplo, o facto da doutrina católica defender que a salvação se obtém pelas obras externas e exteriorizadas para uma dada comunidade. Sendo assim, quem iria conferir a salvação era a comunidade porque esta é que via e analisava as obras. É por isso que alguns autores comparam os sacramentos, exigidos pela Igreja Católica, a uma magia, isto é, são práticas com efeito mágicos para se alcançar, com certeza, a salvação. Outro exemplo é a oração: o que interessa é rezar esse sem fim de dizeres pré-determinados, sejam eles ditos com fé ou não. É o chamado "toma lá, dá cá".
São estas práticas e atitudes religiosas que está a mudar levando a crises no interior de muitas instituições religiosas, do meu ponto de vista, embora, por exemplo, em muitas comunidades, fundamentalmente no interior do país, todas as práticas tradicionais e dogmas teológicos do Cristianismo Católico ainda se assistem fortemente. Todavia, considero que, gradualmente, e numa era de mudança cultural, face à globalização económica e cultural, a um nível global, estas práticas (não para os mais idosos, mas para as novas gerações) tendem a atenuar-se e a instituição católica a perder gradualmente fiéis e, por conseguinte, vai perdendo poder.
Ao pensarmos numa salvação justificada pela fé, a questão religiosa passa a ser apenas individual e subjectiva- relação pessoal com Deus. Por outro lado, a justificação pelas obras está claramente associada a uma "religião comunitária", pois de acordo com Moisés Espírito Santo "é esta que produz o poder social da Igreja Católica fazendo da comunidade um objectivo e a finalidade da própria religião". Neste sentido, independentemente da fé de cada um apenas os actos exteriores é que interessam. Esta religião comunitária organizava-se (e ainda em certas comunidades se organiza) a partir de símbolos e práticas que constituam a coesão de um grupo. A religião e todas as práticas e dogmas a si adjacentes não eram mais do que uma forma de integração social na comunidade e de manter a sua coesão, em que os santos e divindades eram apenas um meio de ligação entre os indivíduos e a religião. Ainda no que se refere à doutrina transmitida aos crentes esta era supérflua, uma vez que o objectivo da instituição era a obtenção do poder social. Embora não recorrendo a uma ideologia de fé, foi com a doutrina da salvação pelas obras que a instituição católica se afirmou e possui actualmente uma grande riqueza, face a ofertas, a esmolas, a dízimas por parte dos crentes, o que, por exemplo numa aldeia, também demonstrava perante os outros um gesto de bondade.
Todavia, dificilmente será possível percepcionar-se com certeza se estas práticas tradicionais religiosas garantem ou não a salvação, mas é fácil perceber-se que em larga medida contrastam com a doutrina do catolicismo, levando cada vez mais a uma nova era religiosa (mais individualista, subjectiva e espiritual), que se justifica pela mutação cultural progressiva que atinge toda a contemporaneidade.
Contudo, não se pode justificar o aparecimento de um individualismo religioso somente a partir da Reforma (quer de Lutero, como Calvino), visto que existem há séculos religiões como o Budismo e o Hinduísmo, que são individualistas e defendem as diferenças entre os indivíduos. Com efeito, estas são religiões onde o indivíduo, que as integra, é autónomo e procura encontrar o seu "eu" interior e qual o caminho a seguir, através de mecanismos, como é o caso da meditação. Estas religiões, na minha perspectiva, embora com um gradual aumento dos seus adeptos, fornecem, por outro lado, mecanismos favoráveis para um individualismo religioso e espiritual, que necessariamente pode não se identificar com qualquer religião.
Os primeiros cristãos também se baseavam numa relação pessoal com Deus. Porém, estes estavam integrados numa cultura que favorecia o comunitarismo religioso, o que vai deste modo contrariar a doutrina inicialmente proferida por Jesus. Há muitos séculos atrás quem quisesse viver o seu individualismo religioso, como eram exemplos os hindus, os budistas ou os ascetas cristãos, tinha de exercer esta sua espiritualidade religiosa fora do social, sendo considerados "indivíduos religiosos fora do Mundo". Com o individualismo que actualmente se pratica já será, portanto, possível ser um "indivíduo religioso no Mundo". Porém, ao contrário do que se possa imaginar, é extremamente difícil o indivíduo encontrar-se consigo próprio, baseado na verdade e de acordo com a sua consciência do que simplesmente realizar as tarefas pré-determinadas pela Igreja Católica e manter para com esta uma relação de obediência e cumprimento dos sacramentos e deveres exigidos.
Com a Reforma surgiu uma moral com um novo código- um código único- em que de acordo com Moisés Espírito Santo "os que pretenderem a perfeição e a salvação terão de obtê-las no quotidiano, no mundo". Uma das principais mudanças para um " individualismo religioso no mundo" foi a mudança no ascetismo monástico, em que a regra conventual passou para uma ordem social e a disciplina profissional. Não obstante, na doutrina católica, a salvação baseia-se numa obediência às regras da Igreja Católica e numa integração na comunidade. Há, neste contexto, que referir a extraordinária ironia do autor de A Religião na Mudança: "o catolicismo é que é a via larga, a fácil, da salvação: basta praticar três ou quatro sacramentos rotineiros, um dos quais- a confissão ou a penitência- supera as falhas e absolve todo e qualquer pecado, da preguiça domingueira ao genocídio. A confissão à hora da morte, então, é a garantia máxima: apaga toda uma vida de pecados". Esta visão infelizmente ainda existe em muitas mentalidades retrógradas e com pouca informação, actualmente.
A partir dos finais do séc. XX, com uma maior visibilidade, a sociedade na sua generalidade (e aqui refiro-me às novas gerações que surgem), começa a adoptar um modo de vida assente num afastamento progressivo dos padrões colectivistas, das doutrinas colectivistas, dos dogmas e certezas religiosos do catolicismo. Porém, esta mutação cultural das mentalidades não é linear e surgem novos paradigmas identitários, como é o caso do "individualismo sociológico". Em Portugal, por exemplo, ainda se assiste a uma cultura baseada no comunitarismo, em que os deveres se remetem, manifestamente, para o colectivo. Neste sentido, e tendo como exemplo a cultura religiosa em Portugal, largamente católica, esta organiza-se a partir de uma personalidade de base e de um conjunto de dogmas e valores universais e necessários a quase todos ou até a todos os que integram estas instituições religiosas, o que traduzir-se-á, inevitavelmente, nos "modelos-ideiais" de instituições como a família ou a escola. Ora, são exactamente estas instituições religiosas que se caracterizam pela verdade, rigor, veemência e solidariedade que estão cada vez mais a se desacreditar, como é exemplo a Igreja Católica, ou até o Islamismo, que já sofreu profundas mudanças, face às mudanças culturais da sociedade actual. Sendo assim, até que ponto as doutrinas teológicas do passado podem permanecer no presente? (7º. paragrafo)
Os indivíduos têm cada vez mais a noção que a sua religiosidade e a sua "salvação" dependem claramente da sua fé, espiritualidade e da sua relação pessoal com Deus, não tendo de passar por práticas pré-definidas de identidades religiosas intermediárias, como é caso flagrante, a religião católica. Neste sentido, e segundo Moisés Espírito Santo, "a religião do futuro é a conexão directa com a fonte. Por isso assistimos a grandes transformações religiosas: por um lado, ao silenciamento das doutrinas tradicionais e por outro lado, ao aparecimento de novas espiritualidades".
Neste contexto, poder-se-á também inferir que a religião, e também de acordo com os textos bíblicos, é universal, ou seja, pode ser adoptada por qualquer cultura ou instituições sociais, uma vez que partindo do princípio de que Deus é pai de todos os indivíduos, este terá indubitavelmente de aceitar todos aqueles que sejam provenientes de diferentes povos ou culturas. Neste sentido, a doutrina de Jesus assumiu uma posição acima de qualquer cultura ou diferentes identidades de género, ou de casado ou solteiro ou polígamos. Esta ideologia também não apresenta claramente qualquer tipo de orientação jurídica, política ou social (como são por exemplo os casos da constituição da família e da moral sexual, tão defendida pelos responsáveis católicos- aqui é visível o aproveitamento dos textos sagrados para o uso no social). Deste ponto de vista, estamos perante um universalismo religioso que não exclui raças, etnias ou origens nacionais distintas. Estes aspectos eram algo que a sociedade de alguns séculos atrás não respeitava, rejeitando todos aqueles que não seguissem claramente os dogmas católicos instituídos, visto que se Jesus quisesse realmente fazer qualquer tipo de restrições sociais ou jurídicas ou impor qualquer tipo de ordem e moralidade sexual tê-lo-ia realizado. Outro exemplo primordial a salientar é a moral cristã, que se pratica em "nome de Deus", que é contra o divórcio, o aborto, as uniões de facto, a sexualidade livre, intolerância religiosa. A meu ver, este parece-me ser um "pecado" muito maior por parte dos responsáveis católicos, pois ao lerem a Bíblia irão ver: não usar o nome de Deus em vão. Jesus, preocupou-se muito mais em espalhar valores como a benevolência, caridade, bondade, honestidade, solidariedade, perdão, conceitos os quais muitos daqueles que eram a "cara" desta instituição não respeitavam. Basta recordarmos os actos cruéis da Inquisição e os espectáculos dramáticos dos Autos de fé.
Porém, não pode esquecer-se, e numa pequena alusão ao texto sagrado escrito, que na maioria das vezes a doutrina religiosa de Jesus é uma teoria relativisadora, o que sugere querer ir de encontro a todo o tipo de particularismos culturais ou sociais, sendo uma ideologia extremamente subjectiva e relativista, e não objectiva ou dogmática, em que "um versículo afirma e outro relativiza". A religião proposta por Jesus Cristo é espiritualista, o que exclui a obrigação de determinadas práticas físicas ou fórmulas e códigos religiosos e jurídicos específicos. No entanto, estas práticas verbais e corporais, como o ir à igreja, ainda hoje se assiste largamente, sendo factor de virtude ser religioso, embora que em sentido descendente. Assiste-se actualmente, portanto, a uma mutação religiosa interior e subjectiva, o que vai muito de encontro à doutrina de Jesus, contrariando as ostentações e práticas exteriores da Igreja Católica (estas e outras). "As religiões (ou as igrejas) foram construções simbólicas (ou sociais)..."
Esta época de mudanças religiosas e novas espiritualidades vai, portanto abalar cada vez mais o poder das instituições, que apesar das tentativas de reabilitação muito dificilmente resistirão a esta nova era religiosa. É, pois, evidente, o aparecimento de uma nova era, face às constantes mutações sociais verificadas, que atinge não só o domínio social e todas as estruturas sociais, como o político, o económico, o sociológico e o campo religioso, e consequentemente as suas instituições em crise que neste trabalho está em análise. Esta era é, portanto, uma transformação global "de paradigmas e modelos analíticos, a ruptura das fronteiras entre razão e intuição, entre positivo e irracional, ciência e magia, material e espiritual, unidade e múltiplo, normal e paranormal, sanidade mental e esquizofrenia", de acordo com o autor de A Religião na Mudança. É também neste contexto que surge falar mais uma vez em "individualismo sociológico".
Surgem, portanto, "alternativas filosóficas litúrgicas". Estamos perante um mundo mais aberto e globalizante, ou seja, uma Nova Era de onde já pode percepcionar-se perfeitamente algumas das suas consequências, também em Portugal. Por exemplo, cada vez mais se difunde um individualismo religioso e um regresso ao ocultismo e à magia ou a terapias alternativas ao mesmo tempo que se constata uma gradual descrença nos valores e dogmas apregoados pela Igreja Católica bem como uma descrença na salvação tradicional o que, por conseguinte, traduzir-se-á no aparecimento de "seitas" ou outros grupos evangélicos ou até a adopção de uma prática religiosa pessoal e subjectiva com a fé, como já salientei. É pois evidente que a crise nas religiões e nas suas instituições reflectem a mudança social e cultural ocorrida, nos nossos dias, sendo segundo Moisés Espírito Santo " o melhor observatório para a mudança social e cultural (...) as atitudes religiosas", dado que a religião está implícita ou explicitamente integrada nas sociedades contemporâneas inerentes a esta transformação universal, visto que a religião é um produto da sociedade onde surge e de todo o conjunto social e simbólico a ela adjacente bem como de todas as referências ou particularismos culturais, sendo muitas vezes a religião e os textos sagrados um meio de justificar os actos sociais. O sobrenatural aparece muitas vezes como uma representação do social. É portanto evidente a estreita relação entre religião e cultura, em que, muitas vezes "não se podendo analisar a cultura que é o foco e porque este ofusca e distorce a visão, analisa-se o projectado, o reflexo, o produto", neste caso específico estudam-se as atitudes religiosas e as principais modificações de modo a percepcionar-se e a crise observada nas instituições religiosas tradicionais.
É com esta nova tendência de individualismo religioso, por um lado, e desacreditação dos dogmas e referências tradicionais católicas, que os membros da Igreja Católica, cada vez mais, se preocupam (embora também se verifique já algumas interrogações por alguns destes), visto que o indivíduo para além de se tornar autónomo também adquire maior liberdade até para construir o seu próprio universo espiritual de relação com Deus ou qualquer outra identidade que entenda, ou até mesmo uma relação de conhecimento espiritual subjectiva.
No entanto apesar desta crise na religião na igreja católica e aparecimento de novas práticas espirituais não podemos esquecer o intenso controlo de liberdade e regulação da acção que o catolicismo ainda hoje exerce sobre os indivíduos, como é exemplo evidente a importância do "senhor prior" numa aldeia do interior. Porém, muitas vezes os citadinos esquecem-se que num Portugal interior ainda se praticam em larga medida as referências dogmáticas do catolicismo. É devido a este dogmatismo extremo, que ainda se regista, que a Nova Era social e cultural tem vindo a emergir grandemente, mas é também importante não esquecer que esta "nova era" não se caracteriza apenas por um abandono das práticas corporais e verbais dogmáticas, sendo essencialmente uma mutação de mentalidades, a um nível cada vez mais global.
É inserido neste contexto de um novo paradigma religioso que se evidenciam as transformações culturais e novas formas e técnicas de culto, isto é, novas filosofias que dão resposta às necessidades dos indivíduos (ex: "saúde, reintegração social ou psíquica, sentido de existência, etc.") com vista a uma "nova era", aderindo assim a novas espiritualidades ou, em alguns casos, basearem-se no cepticismo da ciência.
Alguns exemplos da Nova Era cultural que se verificam:
* Holismo: "totalidade cósmica do ser", em que as partes (os indivíduos) contêm o todo, dado que a matéria e o espírito são inseparáveis. O indivíduo, por si só, também é holístico, pois o corpo e a mente também são algo que não se separa. Daí que actualmente se fale em curas religiosas ou desenvolvimento de problemas físicos ou mentais como psicossomáticos. Neste contexto, existem numerosas formas do espírito realizar qualquer experiência religiosa, como são exemplos o budismo ou o Zen, que se praticam e atingem através de técnicas específicas - yoga, meditação entre outros.
* Energia: As novas espiritualidades estão cada vez mais associadas a uma energia positiva, com vista ao aumento do bem-estar físico e psicológico. Surgem, neste sentido, concepções como o de energia positiva, energia negativa, campos energéticos, vibrações, etc.
* Potencial Humano: Na Nova Era este é um conceito fundamental para o desenvolvimento psicológico, físico e intelectual de qualquer ser humano, que deve conceber-se como único, autónomo e livre. Nesta perspectiva, é cada vez mais corrente reforçar-se a ideia de um pensamento positivo e de uma auto-estima elevada para o desenvolvimento pessoal favorável do indivíduo.
Neste sentido, é pois evidente que também já não faz sentido separar a religião da medicina, pois a religião pode curar, segundo alguns autores. Do meu ponto de vista, e tendo o exemplo próximo de Fátima, aquilo que talvez "cure" realmente o doente não é tanto a religião ou as santidades que curam, mas a fé que se tem ao ir àquele lugar específico. Este é um exemplo crucial do panorama português, na minha opinião, para perceber a importância da religião na vida social e cultural de um indivíduo, pois todos nós desde crianças ouvimos dizer que as promessas que se pedem a Fátima se realizam (e que posteriormente se pagam em Fátima). Este é um dado adquirido por grande parte da cultura portuguesa, quer se queira ou não, ainda que grande parte daqueles que vão a Fátima nem sequer sigam os rituais institucionalizados pela Igreja Católica.
A Nova Era vem assim perturbar todas as referências e dogmas tradicionais da religião católica (colectivizadora) com as novas espiritualidades, apresentando uma tendência para ser uma espiritualidade individualizante, inserida numa "sociedade de indivíduos" cada vez mais evidente, centrada no indivíduo, o que implica a aceitação das diferenças sociais, individuais e religiosas.
A religião, em Portugal, especificamente, e as suas modificações, como reflexo da cultura existente difere das restantes dos outros países, face aos diversos particularismos culturais. Não obstante, verifica-se em Portugal atitudes face à religião semelhantes ao que se passa no resto do mundo, apesar de com menor intensidade. Tal facto, a meu ver, justifica-se também pelo facto de cada vez mais vivermos num mundo mais global a nível social, político, económico, o que inevitavelmente também se evidencia nas práticas religiosas. Ainda aqui a referir-se que em alguns países se assiste a uma resistência mais forte, sobretudo, no mundo islâmico, que argumentam estar a colocar-se em causa a identidade deste povo, sendo essencialmente os grupos que aderiram ao pentecostismo que põem em causa essa "nossa identidade", mas já não se consegue esconder a crise actual.
É importante, a este propósito, referir-se o aparecimento e afirmação deste novo conceito de pentecostismo, que surge como uma nova visão cristã da Nova Era. Sucintamente, entende-se por pentecostismo uma filosofia de vida levada a cabo por igrejas cristãs ou evangélicas, que se baseiam unicamente na Bíblia, distinguindo-se assim dos católicos e, segundo Moisés Espírito Santo, " por não rezarem perfilados com as mãos postas, humilhados e por não adoptarem nos templos um ar macambúzio- são os pentecostais".
É neste contexto interessante fazer-se uma pequena alusão à confusão que pode surgir naqueles católicos que não conhecem a Bíblia e apenas se limitam a obedecer à doutrina e aos dogmas da instituição católica e que posição os membros da igreja devem tomar quando confrontados com estas chamadas (por eles) "seitas". Apenas exclui-los? Mas eles no fundo nada mais fazem do que ler e seguir a palavra de Deus, dos textos sagrados. Este pentecostismo tem contribuído, neste sentido, a que a instituição eclesiástica tenha de reformular as suas práticas litúrgicas e a sua linguagem de maneira a se adaptarem à mutação social e cultural ocorrida. Porém, como reformular afirmações dogmáticas que durante séculos se afirmavam? Por outro lado, a Igreja também não pode contradizer-se e ir contra os seus princípios pré-concebidos, do meu ponto de vista, já ultrapassados, ou seja, tende cada vez mais a constatar-se a sua desacreditação, partindo-se deste modo para uma espiritualidade individual, motivada e resultante das mudanças religiosas que surgem como um processo de mutação que se assiste no campo do psiquismo colectivo, partindo-se, deste modo, para o fim dos dogmatismos e dos colectivismos, com vista a uma emancipação individual de cada ser humano.
Considerações finais: A crise nas religiões (e mas igrejas) como pronuncio de uma mudança cultural, espiritual e social
As recentes mudanças culturais tiveram um impacto relevante sobre a sensibilidade e o comportamento religiosos. Muitos olham apenas ao fenómeno das chamadas "seitas" ou dos novos movimentos e grupos religiosos. É preciso procurar uma visão mais completa da situação actual, caracterizada por uma pluralidade de tendências diversas e mesmo contraditórias. As duas atitudes mais evidentes são as "seitas" ou o subjectivismo.
As mutações sociais e culturais aceleradas geram nos indivíduos uma situação de incerteza, da qual estes procuram sair. Há duas saídas mais nítidas e opostas, que representam os extremos da situação: de um lado, a redução da religião a um facto privado ou mesmo meramente íntimo e subjectivo (que N. Luckmann chamou a "religião invisível"); de outro lado, a escolha de uma "seita" ou de um movimento fundamentalista, que afirma, com extrema segurança, uma verdade e impõe aos membros do grupo uma autoridade indiscutível, procurando envolver totalmente as pessoas e isolar o grupo em relação à sociedade. A força do subjectivismo e do individualismo é cada vez mais evidente: O subjectivismo tende a penetrar também nas Igrejas e até no mundo das seitas e movimentos fundamentalistas.
O que parece também acontecer é que, de um lado, as instituições religiosas perdem força como instituições, e, de outro, elas são mais ou menos aceites conforme elas respondam e satisfaçam às necessidades e desejos imediatos das pessoas. Isso tem transformado muitas formas religiosas em "mercado da fé", adoptando os recursos da propaganda e do "marketing". Neste sentido, a religião desempenha outro papel social. Não há mais aquela ideia de "salvação", mas de satisfação de expectativas dos indivíduos. De novo, se é confrontado com a "ideologia da modernidade" do individualismo, no campo religioso, sobre as perspectivas comunitárias e sociais. Estamos, portanto, como foi analisado anteriormente, perante uma Nova Era: Esta tendência manifesta-se também num novo movimento religioso, de fronteiras mal definidas, relacionada com a chamada pós-modernidade. Aqui verifica-se uma redescoberta do divino e do sagrado, separado, porém, da integração numa dada religião definida e institucionalizada. Procura-se, talvez, uma espécie de comunhão com o cosmos, uma imersão no "Todo", um "holismo sem contornos". Apela-se para religiões orientais e rejeitam-se o cristianismo e os monoteísmos encaradas como religiões conservadoras. Procura-se uma nova era de paz e uma religião afectiva, sem conteúdos doutrinais claramente concretos. Toda esta nova perspectiva de mutações mentais e culturais exigem, evidentemente, atitudes novas por parte da Igreja. A igreja tradicional, pensada para outro tipo de sociedade, deve gerar novas formas de actuação, mais atentas à busca de experiência religiosa das pessoas, à criação de novas formas de comunicação e comunidade, à necessidade de promover uma presença pública mais dinâmica numa sociedade que não considera mais a religião como o centro ou como uma norma a cumprir obstinadamente. A questão religiosa está interior e exteriormente confrontada com a mudança. Não se trata de uma questão nova, pelo contrário, a Igreja sempre coexistiu com as sociedades e os Estados. A existência de pensamento ideológico (que invoca a laicidade do Estado, mas vem das raízes dos movimentos marxistas revolucionários que consideravam a religião como ópio do povo); a persistência do laicismo iluminista (que teve sempre muito a ver com desígnios de hegemonia política); e uma certa revolta da mentalidade relativista e hedonista corrente contra a Igreja (assinalável por exemplo em reacções de vários movimentos com destaque nos média), não é mais do que uma nova manifestação de uma corrente em confrontação com a nova era cultural.
E importante aqui fazer-se uma pequena alusão a Holbwachs, que esclareceu claramente o aspecto do religioso como perpetuação de lembranças, afirmando que estas lembranças não são o passado, mas essencialmente uma reconstituição deste na vida em constante mutação dos homens, grupos ou instituições. Para se inserir no presente, é imperativo que estas se adaptem ou até mesmo devem sofrer uma selecção, e aquelas que passam não têm o mesmo valor semântico, ou afectivo de quando eram acontecimentos vividos e não apenas comemorados. Deve, portanto, concluir-se que ainda hoje o catolicismo é profundamente "conservador", assistindo-se a um carácter "imobilista" da religião. Este deve entender-se como uma barreira ou obstáculo para com a mudança, as transformações e as mutações das mentalidades, das estruturas, do social sob todos seus aspectos, ao longo dos séculos. Quando algumas igrejas cristãs não se sentem completamente de acordo com o mundo à sua volta, mudam elas também, remetendo-se para as suas origens ou ao que elas acreditam ser as verdadeiras origens do cristianismo. A ideologia da Reforma protestante, por exemplo, não é uma ideologia da mudança, mas do retorno à pureza do passado. Pode, portanto falar-se também em ideologias que escondem, sob a continuidade, rupturas e mudanças profundas - ou que dissimulam, com a ajuda de factores tranquilizantes, as verdadeiras causas das mudanças religiosas. Mas, como o modo de vida das populações muda com o passar do tempo e, com as transformações económicas, é inevitável que novas formas de religião surgem. Apesar de manterem esse mito de origem ou de acontecimentos históricos passados, a realidade é que as religiões mudam como todos os factos sociais, dado que elas seguem as grandes mutações, que fizeram passar os homens do nomadismo à sedentarização, das cidades aos impérios, das civilizações rurais às sociedades industriais, entre muitos outros exemplos.
Conclusão:
Neste trabalho, realizei uma abordagem, embora superficial, sobre as principais alterações e tendências religiosas que reflectem fortemente o crescimento de uma crise no interior das religiões e das igrejas das religiões tradicionais, quer quanto ao seu fundo teológico, quer quanto ao seu papel social, que se modificou acompanhando as mutações sociais e culturais existentes numa sociedade cada vez mais globalizante, ao que se lhe acrescenta um individualismo sociológico dominante. Pode, portanto, concluir-se que actualmente se verificam diversas mudanças religiosas que anunciam a chegada de uma "Nova Era".
Numa época de mudanças religiosas e crise das instituições tradicionais , de uma forma sucinta, estas são as principais mudanças religiosas que se constatam: Descrença na doutrina ideológica do catolicismo- dogmática, ultrapassada e manipuladora; Descrédito nos rituais comunitários, ainda que alguns sejam mantidos por tradição (ex.: casamento); Adopção de uma religiosidade cada vez mais subjectiva- a "salvação" é por mérito individual; Conservadorismo da instituição católica que apelam para uma reforma nas dogmas instituídos; Desenvolvimento de novas tendências religiosas, como o exemplo do Pentecostismo moderno; Aparecimento e adesão a novas espiritualidades e movimentos: holismo, energias, potencial humano bem como aproximação a outras espiritualidades orientais (ex.: Budismo, Zen, Hinduísmo); Expansão das doutrinas teosóficas e interesse gradual por temas espirituais, esotéricos, do oculto, adesão a medicinas ou psicoterapias alternativas; Preferência gradual do conceito de "espiritual" ao de "religioso" (também o uso do termo de Deus tende a diminuir). Apesar de existir uma opinião generalizada de que as religiões tradicionais já não têm futuro, assiste-se ao aumento da espiritualidade dos indivíduos, o que reflecte a sociedade cultural onde se inserem; Sincretismo, isto é, mistura de várias ideologias.
Neste contexto, é pois, evidente o desenvolvimento de uma espiritualidade moderna, sem religião institucionalizada. Estamos perante uma "Nova Era". Esta nova tendência conduz a que comece a desenvolver-se uma religiosidade livre, pessoal e subjectiva de relação com "Deus" ou com qualquer identidade divina bem como poder-se-á também traduz num maior conhecimento individual do ser humano, afastando-se, deste modo, de todo o conjunto de paradigmas simbólicos, dogmáticos e controladores, no caso específico português, do Catolicismo. Todavia, esta mudança cultural, que se manifesta na religião, ainda está pouco evidente, a meu ver , em Portugal, em que apesar da ideologia estar a perder seguidores, as instituições tão depressa não desaparecem, uma vez que estas ainda possuem grande influência na cultura portuguesa, fundamentalmente, no interior no país, sendo um pretexto de festa em qualquer ocasião (casamentos, natal, festas da aldeia, etc.). Ainda a referir que muitas pessoas obedecem à Igreja, mesmo que não acreditem na doutrina (há muito respeito, fruto da cultura talvez ainda retrógrada e conservadora herdada dos antepassados). Por fim, ainda a salientar, e para concluir de tudo o que pesquisei, a enorme capacidade que a Igreja católica têm para apresentar uma resposta para tudo. Neste sentido, e sendo a religião um fenómeno social global, podemos estudar todos os aspectos sociais a partir da religião, de um modo geral. Porém, esta instituição depara-se com inúmeros problemas actualmente pois sendo infalível e não se podendo pôr em causa toda essa sucessão de dogmas e disciplina, está impedida de reformular a sua doutrina repleta contrariedades.
Logo, cada vez é mais vísivel a crise nas religiões e nas igrejas, de onde destaco a igreja catolica, quanto à sua fundo teológico, quer quanto à sua função social.
Bibliografia:
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Religião e Modernidade